Eram ótimos despertadores os pesadelos. Pelo menos era isso que Augusto pensava. Já estava acostumado com eles, pois eles aconteciam com muita frequência. Só que havia um porém: Augusto nunca lembrava direito de seus pesadelos, apenas sabia que os tinha porque acordava muito suado e aflito, quando não gritando em desespero. Tudo que ele recordava era que ficava cara-a-cara com uma espécie de maldade absurda. Não sabia qual era sua face… Era como se tivesse muitas e elas todas se misturassem num véu negro de estrelas mortas e sem esperança. Ora, sua vida também não era muito diferente de um pesadelo. Ele era muito sozinho e nunca havia ninguém para ajudá-lo… Não era como se ele quisesse não ter alguém, ele inclusive lia livros de como fazer amigos (como aquele de Dale Carnegie), assistia vídeos no Youtube de como ter mais carisma, praticava no espelho um sorriso bonito, mas parecia que estava amaldiçoado, como se sua vida refletisse aquele verso de “Hurt”: everyone I know goes away in the end… Mas porque iam embora? “Sou muito estranho pra ser aturado por alguém” era o que ele dizia a si mesmo. Não era estranho como umas pessoas que já havia visto na internet, como aquela mulher que fez várias cirurgias plásticas para se parecer com uma vaca, ou o cara de mais de quarenta anos que dizia ser uma garota de oito… Isso era uma estranheza delirante, doentia. A estranheza de Augusto tinha origem mais simples: há pessoas que são estranhas por terem orelhas muito grandes, ou por terem mais de 5 dedos em cada mão, ele era estranho por ter uma imaginação maior que o normal — apenas isso. Isso o fazia ser interessante também… Interessante (como uma raposa acha um galinheiro aberto interessante) até para algo que não habita esse mundo. “Algo”? Eufemismo! Era uma criatura tão antiga quanto a vida neste planeta… E ela estava com fome. Logo menos viria visitar Augusto, como regularmente o fazia… Ele só precisava mergulhar naquele buraco profundo, às vezes visitado por coelhos apressados, e dar de bunda no chão. Ou teto? Não dava para saber direito. Afinal, nesse lugar o chão podia ser, na verdade, o teto, e o teto, a parede. As regras eram sempre outras! Quem dera fosse uma mera confusão de nome das coisas…
Augusto tomava seu café, com gosto de morango, enquanto refletia sobre o porquê as horas estavam marcadas como duzentos e cinquenta e três mil para às trinta. Afinal, ainda era de manhã! “Oras, as horas estão bêbadas!”, pensou. Disse adeus para sua ovelha de estimação e foi para o ponto de ônibus. O ponto de ônibus, sem mais nem menos, se transformou na escola que havia estudado dez anos atrás e Augusto entrou nela, sem pestanejar. Enquanto andava pelo corredor do segundo andar, reparou que as meninas dali riam descontroladamente e apontavam para ele. Olhou para baixo e estremeceu! Estava sem calça e usando sua cueca velha e furada de ficar em casa! Correu desesperado. Vendo que não estava tendo muito progresso, falou para si mesmo “preciso voar daqui!”. Abriu a porta da sala da diretora, com dificuldade, e pulou da janela. Voou como o Super-Homem, sem auxílio de asas. Era natural para ele voar ali! Estando nas alturas, via as pessoas andando lá embaixo, como se fossem formiguinhas. Ele desviava de prédios, dizia olá para as pombas, e molhava a cara nas nuvens. Sentia muito prazer em voar! Porém, apesar da facilidade que tinha em fazer isso, seu poder não era ilimitado, e logo começou a falhar… Começou a despencar e caiu em um cemitério. O Sol caiu junto, dando lugar à uma noite sem Lua. Depois que levantou do chão, sentiu o cheiro de carniça e de gases podres, advindos dos mortos putrefatos, e sentia vermes andando entre seus dedos do pé, dando mordidinhas, como se estivessem provando sua carne para saber se ele era o novo morto do pedaço. Dessa vez vestia calças, porém estava com os pés descalços. “Algum coveiro me ajude! Por favor!” gritou Augusto, pois sabia que em cemitérios haviam coveiros, apesar de parecer que aquele cemitério só continha mortos e ele. Ouviu de longe um “heeeey!”. A voz era rasgada e se mesclava com os sons de corvos. Enquanto Augusto sacudia os pés para se livrar dos vermes — que agora pareciam mais com sanguessugas –, uma figura encapuzada, com corvos em ambos os ombros, surgiu em sua frente. “Odin?!” indagou Augusto, exasperado. Chegou nessa conclusão vendo os dois corvos. O homem começou, então, a falar, como se estivesse recitando uma poesia: “Skin the sun… Fall asleep… Wish away… The soul is cheap… Lesson learned… Wish me luck… Soothe the burn… Wake me up.”. Começou a repetir tudo de novo, como que em mantra. Augusto de repente se tocou: “Kurt Cobain!”, e perguntou logo em seguida, automaticamente em inglês, “what are you doing here, in this rotten cemetery?!”. O homem jogou o capuz para trás, revelando que era realmente ele, Kurt Cobain. Encarou por um tempo o Augusto, como se estivesse querendo ver sua alma. Por fim, Kurt entregou uma lamparina para ele e apontou para uma igrejinha que havia não muito longe dali, ainda nos perímetros do cemitério. Augusto sentia que teria que enfrentar algo naquele lugar. Perguntou para Kurt o que era que o esperava lá. Kurt arregalou os olhos e sussurrou nos ouvidos de Augusto, seis vezes: “daddy’s little girl ain’t a girl no more”. Augusto sentiu sua espinha dorsal arrepiar… Era como se já tivesse enfrentado essa coisa antes, mas ao mesmo tempo não sabia o que era. Estava tendo um déjà vu e esse déjà vu vinha com uma certeza de que ele teria que entrar naquela igrejinha armado. “Do you have some kind of weapon, Kurt? I need urgentemente, my friend.”. Kurt, respondeu com desespero “I swear that I don’t have a gun! No, I don’t have a gun! No, I don’t have a gun!”, porém era tudo um ato teatral, pois começou a rir no final. Seus corvos, ao notarem o riso irônico de seu mestre, voaram com pressa. Logo menos voltaram com uma espingarda calibre 20 nos bicos (cada um estava em uma extremidade da arma, abocanhando-a). Soltaram a arma nas mãos de Augusto, enquanto voavam a um metro de altura de sua cabeça. Havia colocado a lamparina no chão antes de pegar a arma. Tendo-a em mãos, a destravou na hora. Não precisou checar se havia munição, confiava em Kurt. Perguntou, por fim, se ele tinha algum conselho, alguma dica para lhe dar, pois estava prestes a enfrentar algo que sabia que era maligno. Kurt, então, apenas virou as costas e começou a andar. Quando estava distante, quase indefinido pelo véu noturno, virou e disse: “nothing really bothers her, she just wants to love herself”. Em seguida, cobriu sua cabeça com o capuz e desvaneceu na escuridão. Augusto respirou fundo, deu à uma de suas mãos o trabalho de segurar a arma sozinha e pegou com a outra a lamparina que se encontrava no chão.
Então, percebeu-se dentro da igrejinha. Não questionou nada. Gritou “o que estiver aqui, venha me enfrentar!”. Em resposta, ouviu um choro… Parecia que vinha do confessionário. Pelos soluços parecia ser uma menina… Augusto ficou preocupado, começou a achar que estava tendo conclusões precipitadas… Ir lá matar uma menina? Não, não faria isso. “Me desculpe! Achei que haveria um monstro aqui!”, se explicou. O choro cessou. “Venha até cá, Augusto. Venha confessar seus pecados para mim!” falou a menina, num tom infantil e meigo. Augusto largou a espingarda no chão e foi para lá, correndo. Estava hipnotizado por aquela voz. “Aí está você! Ahahahaha o que achou de mim, tenho cara de monstro?” falou a menina olhando Augusto nos olhos. Era absolutamente maravilhosa! Deveria ter no máximo vinte anos… Tinha olhos verdes, cabelos loiros e escuros, como também longos, nariz arrebitado, sobrancelhas definidas e boca rosada. Seu rosto não era longo, mas também não era arredondado. Ela parecia uma mulher madura, mas tinha feições de criança. “Eu te conheço? Sinto que te conheço”, perguntou Augusto. “Sim… Sempre tomamos vinho juntos por aqui. Vinho dessa igrejinha!” falou energeticamente, e saiu daquele confessionário saltitando, em busca de vinho. Augusto foi atrás. A sensação de déjà vu apareceu de novo, como também a certeza de que precisava estar armado. “Tó aqui o seu vinho!” disse a menina. Augusto estava começando a temer aquela menina. “Tome… Está delicioso! Como você…” falou a menina de maneira brincalhona, enquanto botava uma mão na cara de Augusto. Ele não se deixou enganar por aquele truque de sedução. Negou. Nisso, um vento com um frio absoluto entrou pelas portas e janelas. A lamparina que Augusto ainda segurava se apagou. Não dava para ver nada. Logo, uma voz bem mais grave que a dele rasgou o ar gélido dali: “EU DISSE PRA TOMAR, AUGUSTO!”. Ele, com o coração à mil, tomou, ao mesmo tempo que derrubava metade do vinho no chão, de tanto que tremia. Tinha gosto de sangue. “Gostou da minha piada de antes, Augusto? Hahaha é delicioso como você porque o vinho VEIO de você”. A voz modulava entre a meiga e a das zonas abissais. “Será que o rosto também tá mudando?”… Tal pensamento fez Augusto congelar de vez, o travando no mesmo lugar. Era preciso pegar a espingarda… Mas era impossível! Sentiu uma mão fria e escorregadia pegar na sua mão, acompanhada de um sussurro “Venha, menino… vamos brincar!”.
Augusto estava agora na casa de sua avó por parte de pai, no quartinho que ficava lá fora no quintal, perto da piscina. Era muito escuro lá e, quando Augusto era menor, ele havia muito medo de ficar sozinho ali, principalmente no quartinho, pois lá havia um quadro que sua avó tinha pintado, um retrato de seu tio criança — o quadro, porém, era terrível! O fundo do quadro era vermelho-sangue e a aparência do tio era de um lunático! “Acenda a luz, meu bem, está escuro aqui…” disse a voz da avó dele. “Nossa, vó… Que loucura vir aqui nesse escuro… Pera aí!”. Augusto foi em direção ao interruptor e tentou ligar a luz. Nada. “Vish… Parece que a luz tá queimada!” falou Augusto. A avó disse, então, “que pena, Augustinho! A vovó vai lá pegar uma lâmpada pra você, tá bom? Fica aqui e cuida do meu Godozinho”. Augusto arrepiou. “Godozinho” era seu tio Godofredo, o qual sua avó tinha pintado quando ele era criança. Mas ele havia morrido nove anos atrás! Suicídio. Tentou abrir a porta pela qual sua avó tinha saído — estava trancada. “VÓ, ME AJUDA!!! ME AJUDA!!!” gritava Augusto, no escuro, sozinho com Godofredo. Não acreditava que aquilo estava acontecendo. “Isso tem que ser um pesadelo, isso tem que ser um pesadelo, isso tem que ser um pesadelo…” falava para si mesmo, para tentar se acalmar. Tentou ligar a luz de novo. “Por favor, Deus!” exclamou Augusto, mesmo sendo ateu. A luz ligou, mas piscava freneticamente, como se estivesse prestes a queimar. Do nada sentiu uma mãozinha lhe beliscar o braço. “Deus nunca esteve aqui”. A lâmpada estourou e tudo ali se engoliu em um mar de sombras.
Estava de volta ao cemitério. Porém era como se tivesse perdido algo… Não sabia direito o quê. Se sentia abatido, como se alguém importante para ele tivesse morrido, ou como se tivesse perdido a única oportunidade de mudar sua condição de vida para melhor. O seu coração batia frio e com precisão, num ritmo mecânico e sem acentuações, como um morto-vivo que perde os diferentes jeitos de olhar e só olha com fome. Ficou parado olhando para o céu. Pensou: “uma noite sem lua para um cara sem alma…”. Não sabia o porquê havia pensado naquilo, mas tinha a ver com aquele sentimento do coração… Levantou e começou a andar pelo cemitério. Olhava as lápides e via que todos aqueles nomes lhe eram familiares. “Ana Gabriela Farias; Hugo da Rocha Silva; Mariana Roberta Campos; Arthur Lusper…” e continuou lendo, lápide por lápide. Foram mais de trinta lápides. Nenhum nome lhe era estranho. Aos poucos, os nomes foram evocando rostos e tudo foi fazendo sentido para Augusto. Todos que estavam enterrados foram, em algum momento na história dele, seus amigos ou amigas. Começou a ouvir vozes. “Porque você me abandonou quando eu mais precisei de você?”; “Você não liga para ninguém além de você mesmo”; “Você não tem moral nenhuma!”; “Você não passa de um ser frio, calculista e manipulador!”; “Porque você entrou na minha vida se depois foi embora sem nem mesmo se despedir?”; Augusto não parava de ouvi-las. Era muitas vozes! Vozes daqueles amigos e amigas. Mas Augusto estava indiferente… Sabia que deveria estar desesperado e, talvez, chorando… Só que só estava ali, ouvindo, como se todas aquelas vozes fossem habituais e normais. Continuou andando, sem ligar para o que diziam. Não muito longe dali avistou a igrejinha. “Aquele lugar me é familiar…” pensou. Começou a andar até lá, sem pressa, com um ar fúnebre em seu rosto. Estando de frente à porta da frente da igreja, que era iluminada por velas ali no chão, um corvo pousou em seu ombro. “Olhe para o chão, rapaz! Não vê que lhe falta algo?!” falou o corvo, com uma voz aguda, levemente irritante. Augusto olhou… A vela iluminava-lhe o corpo, mas nenhuma sombra aparecia onde a luz falhava em fechar o abraço. Ao perceber isso, seu coração errou o ritmo, como que de propósito. “Cadê minha sombra?” ecoou a pergunta de Augusto por ali. O corvo lhe bicou a cabeça de levinho e disse “não a deixe solta por aí!” e voou. Augusto, na igrejinha, entrou. Pensava no que o corvo queria dizer com aquilo…
A mesma menina de antes estava lá. Ela encenava algo no altar com alguma outra pessoa, porém não dava para identificar muito bem quem aquela pessoa era — era preciso chegar mais perto. “Lembra de mim, Augusto? O que você tá achando da nossa brincadeira?” falou com aquela voz meiga e infantil. Augusto, sem apresentar muitas reações, apenas respondeu “não me lembro de você”. A menina riu, enquanto fazia movimentos histriônicos com o desconhecido. “Que tal você sentar ali junto de meu amigo na terceira fileira? Talvez dele você lembre…”. Augusto foi andando em direção à terceira fileira, porém só conseguia ver um pedaço da cabeça da pessoa que estava ali sentada… Deveria ser uma pessoa muito baixa, ou talvez uma criança. Sentou, não conseguindo ver muito o rosto dela. A pessoa, então, pegou em sua mão, sem virar o rosto. “Titio tem medo de peças sombrias!”. Augusto soou frio. “Godo!” falou, lembrando de tudo. “Você roubou minha sombra, não roubou?!”. Seu tio, então, apenas apontou para a outra pessoa no altar. Era a sombra de Augusto, porém, tridimensional e numa escala muito maior.. Ao notar sua parte perdida ali no palco, o coração de Augusto disparou, como se quisesse sair de seu peito e ir para a sombra. Suas sístoles e diástoles eram como socos de um boxeador raivoso e a caixa toráxica era seu inimigo fatal. Contudo, não durou muito tempo e desistiu de lutar, passando para o luto… Era como se tivesse reconhecido seu futuro padecimento em terrenos agitados, preferindo sua sobrevivência no calmo deserto de mornas brisas de Augusto em sua incompletude. Enquanto isso, a sombra estava lá no altar, encenando com a menina. Eles pareciam se conhecer há tempos. O jeito que eles se mexiam… Era como uma dança. Ou um ritual? “Vamos comer ele logo, eu tô com fome!” falou a menina, alegremente, para a sombra. A sombra colocou a mão no rosto da menina e apertou suas bochechas — até elas ficarem vermelhas –, como se ela fosse apenas uma criança mimada. “Você não passa de uma cadela atrás de seu osso” falou sem vacilo. A menina não respondeu, mas não perdeu seu olhar de admiração pela sombra. Augusto, que já estava se levantando, notou que Godofredo não estava mais de seu lado. Olhou para a frente e sua sombra havia desaparecido também. A menina começou a correr em sua direção. Augusto, seguindo os instintos que ainda lhe restava, fugiu dali. Pensava repetidamente “porque minha sombra estava com ela?!” e não encontrava respostas. Quando saiu pela porta da frente, as velas do chão, que antes estavam acesas, agora estavam apagadas. Um tsunami de escuridão vinha em sua direção. Iria ser pego por ele inevitavelmente. Antes que pudesse esboçar qualquer reação perante aquilo tudo, lembrou da última mensagem de Kurt “she just wants to love herself”. Fechou os olhos e perguntou, calmamente: “Quem é você e o que você quer?”. Então, o tsunami sumiu. Ficaram suspensos num ambiente reinado pela palidez. A menina brotou, bem em sua frente, seus olhos eram buracos-negros e seus cabelos agora formavam um longo véu da mais pura escuridão. “Eu, Augusto, sou a Morte.” falou com uma voz serena que partilhava leves tons de cansaço, e às vezes, de júbilo. O corpo transformou-se no corpo de uma mulher madura. Estava nua, porém seus cabelos lhe cobriam os seios e a virilha. “Venho porque você, em sua imaginação sem fim, de alguma forma me convida, Augusto. Venho também, porque você é saboroso e me serve bem! Ha! Meu estômago que o diga! Há anos ele agradece! De um tempo pra cá notei que você poderia me servir de outras formas também… Bem, não você — afinal, você não passa de um verme qualquer nessa cadeia alimentar patética –, mas sua sombra. Além dela acelerar meu processo lá fora, ela me faz companhia. Quem sabe não vira meu eterno marido? Estou começando a admirar ela, apesar d’ela ser um pouco mal educada. Eu nunca vi uma sombra com tanto ódio, ressentimento, e vontade de destruição…”, Augusto arregalava seus olhos e sua face ia se contorcendo como se tivesse em delírio… “Não ligo de falar essas coisas para você, Augusto, pois logo menos lhe devorarei, como sempre faço, e, você não lembrará de nada. Cada vez que repito esse processo, sua sombra ganha um pouco mais de controle sobre você. Mas o que é ‘você’, afinal? Só essa parte ridícula de você que luta para outros e não para si, que acredita em ‘moralidade’ e ‘altruísmo’! Sem sua sombra você não tem voz e é menos que um verme, Augusto. Eca! Chega de falar de vermes…”. Ela abriu a boca em largura e altura que chegava a ultrapassar seu próprio tamanho e, então, engoliu Augusto — que nem gritar conseguiu! –, saboreando cada músculo, gordura e osso daquele corpo que, apesar de fraco, era responsável pelo nascimento daquela sombra que até a Morte, um pouco, admirava. Finalmente, a sombra de Augusto apareceu. “Já devorou o fracote?!” indagou. A Morte, colocando os braços em volta do pescoço da sombra e levando o rosto próximo de seu ouvido, sussurrou “Pra quê a pressa? Logo menos você estará no controle”. Por último, colando seu corpo no corpo da sombra, sugeriu, num tom incisivo e, contraditoriamente, carinhoso: “mas enquanto isso não acontece, que tal nos divertirmos um pouco?”.
Sonho delirante como os meus. Só que não lembro inteiramente de nenhum. É como se quando acordasse ainda sentisse o gosto de uma bebida que não sei mais qual seja…
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